Lembro-me perfeitamente de um amigo meu querer ser o Super-homem. Achei ambicioso, sobretudo porque já havia um, mas não me parecia totalmente implausível. Mas naquela idade também jurava a pés juntos que os presentes de Natal eram distribuídos pelo mundo inteiro numa só noite por um octogenário com um fato à Benfica e renas voadoras, por isso dizer-se que eu era crédula é um eufemismo.
Não sei se o meu amigo acabou por seguir a carreira de super-herói mas eu cá deixei de parte todos os meus projectos de infância: ser professora, cabeleireira, arqueóloga, cantora, bailarina… A verdade é que sou a pessoa mais impaciente do mundo e, se fosse professora, teria, seguramente, protagonizado um episódio à la “dá-me o telemóvel jááá!”. Também sou a nojinhas mor e seria incapaz de tocar num cabelo que fosse de um estranho, por isso ser cabeleireira também está fora de questão. Nunca me atraiu especialmente a ideia do fundo de desemprego, por isso exclui também a arqueologia. E parece que para se ser cantora ou bailarina é preciso ter algum talento: eu sempre fui elogiada como sendo apenas “esforçada”…
Mas, ainda que longe das salas de aulas, dos salões de beleza, das escavações e do palco, e a fazer aquilo que nunca ponderei fazer, não me posso queixar do meu actual emprego. Gosto do sítio onde trabalho e especialmente das pessoas com quem trabalho: são inteligentes, cultas, honestas, diligentes, há um ou outro “c’lega” bem giro e, mais importante do que tudo o resto, muitos são meus amigos e isso é uma vantagem que poucas profissões (ou empresas) têm. Claro, há sempre uns dias melhores e outros piores, uns dias de 16 horas de enfiada à frente do computador, fins-de-semana de verão passados sob stress, luz artificial e ar-condicionado, um ou outro colega que só de saca-agrafos enfiado nas respectivas órbitas… Mas, fora isso, não tenho grande razão de queixa.
Ainda assim, mesmo ciente de que dificilmente poderei enveredar por outro ramo e encontrar o emprego ideal (haverá algum?), dou por mim a pensar mais vezes do que seria recomendável “e se eu mandasse tudo à m*rda e mudasse radicalmente de vida?”.
Se eu ganhasse o euromilhões, deixava o emprego que tenho hoje: não deixava de trabalhar, mas deixava de fazer o que faço hoje, o que me faz chegar à triste conclusão de que, ao contrário do que sempre quis acreditar, o meu drive profissional não é exclusivamente o estímulo intelectual, mas antes o aspecto financeiro. Também chego à outra triste conclusão de que com 26 anos, já não tenho tempo nem paciência para recomeçar do zero, quer nos estudos quer noutro emprego.
Mas! Apesar de todos estes reality checks, não deixo de fantasiar sobre a vida profissional que sempre quis ter mas que outra pessoa qualquer está a viver… Ainda tenho muitas respostas ao “então e tu, o que queres ser quando fores grande?”… e continuam todas sem ser “advogada”.
Na verdade, o que eu adorava mesmo era:
1. Ser CEO ou Music Executive de uma editora de música, tipo Epic Records ou EMI, uma espécie de versão feminina do David Mourão Ferreira mas em N.I., L.A. ou Londres e não na Valentim de Carvalho de Paço de Arcos, por favor…
2. Escrever para a Rough Guide (sendo certo que viajar sozinha, em trabalho, com prazos e pressões comerciais não é a mesma coisa que andar a ver o mundo de férias e com companhia).
3. Ser “major donor executive” que não é mais do que um nome pomposo para “angariador de fundos”, mas para fundações e eventos de alto gabarito. Coisa chique. É, basicamente, uma espécie de relações públicas para uma boa causa que arranja patrocínios e organiza eventos para que os those who have dêem um pedacinho das respectivas fortunas aos those who have not, em troca da devida publicidade e promoção, está claro.
4. Ser crítica de música e/ou cinema (se bem que conheço um rapaz que é crítico de cinema e desfez a imagem utópica que eu tinha da coisa. Contou-me o E. que ele é incapaz de ver um filme, uma série, um anúncio que seja, sem fazer uma minuciosa análise crítica e objectiva: não se deixa apaixonar pelos filmes, pelos actores, pelos enredos, i.e. ligeiríssimo inconveniente aqui para a je, tendo em conta a minha muito pouco sã obsessão com certos actores e filmes).
E o caro leitor, se ganhasse o euromilhões, continuava com o emprego que tem hoje? Se pudesse exercer qualquer profissão, independente do curso ou talento necessários, qual seria?
Fotógrafa, bailarina, manicure, designer, estilista, directora de marketing, pintora, juri dos ídolos ou do "runway project", mas decididamente nunca advogada... Nem sei como é que te foste meter nisso... Pobrezinha...
ReplyDeleteSe eu ganhasse o Euromilhões gostava de ser desempregada. Mas lá está: tenho habilitações académicas e não tenho talento. Sonhos...
ReplyDeleteSalomé